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O Trigo e o Bolo

O Trigo

Foi no Oriente Médio que o homem, pela primeira vez, começou a desenvolver a agricultura e a criação dos animais. E, quando se fala em agricultura, está se falando de cereais. Não um, mas vários. Qual foi o primeiro da lista: o sorgo, a cevada, o centeio ou o trigo? Não se sabe. Mas, seja qual for, há cerca de 10 mil anos, eles já eram plantados nessa região, que hoje se estende do Egito ao Iraque e, não sem motivo, foi batizada pelos historiadores de Crescente Fértil. De lá, esses cereais se espalharam pelo mundo.

As sementes mais antigas de trigo já encontradas datam de 6700 a.C. e foram plantadas pelos povos que habitavam a antiga Mesopotâmia. Os grãos eram misturados com peixes, castanhas, frutas e água, numa espécie de papa levada ao fogo. Não parecia uma receita muito apetitosa. Bem diferente do pão, nascido da inventividade dos egípcios. Por volta de 4000 a.C., eles já tiravam proveito do processo de fermentação do trigo, processo que, aliás, também era utilizado na fabricação do vinho e da cerveja. Os egípcios descobriram o que hoje todo mundo que bate um bolo sabe: a farinha feita dos grãos de trigo ganhava volume quando se adicionava o levedo à massa levada ao forno.

Além de servir à população, os pães ou os biscoitos egípcios eram preparados de forma mais caprichada como uma oferenda aos deuses e utilizados em rituais mágicos – às vezes, moldados como formas humanas e animais. Mais tarde, a receita da massa se espalhou pelos povos vizinhos, fazendo com que o pão se tornasse o alimento símbolo das civilizações mediterrâneas. A tal ponto que os antigos gregos e romanos viam nele o equilíbrio perfeito de todos os elementos da natureza. Na tradição cristã, o pão e o vinho, por sua vez, foram usados para simbolizar a vida na Eucaristia. Na Páscoa judaica, o pão ázimo (assado sem fermento) tornou-se uma comida obrigatória.

Tanta história levou ao nascimento das padarias na Europa e à expansão do cultivo do trigo para zonas mais frias, onde a planta se aclimatava melhor, como a Polônia e a Rússia. Por onde se espalhou, o trigo se tornou vitorioso, a tal ponto que os povos que se destacaram na colheita e no comércio dos grãos dominaram com mais facilidade os que eram mais carentes do cereal. Com o tempo, e o desenvolvimento de novas tecnologias, como a rotação de culturas e a criação dos moinhos de vento, houve o aumento de produtividade. No século 15, a planta foi levada na bagagem dos grandes navegadores que chegaram à América.

Do outro lado do mundo, o trigo fez sucesso até em terras asiáticas, que, se imagina, tenham olhos apenas para o arroz. Quem não sabe a história de Marco Polo, que, no século 13, esteve na China, de onde teria trazido o macarrão para a Itália? A história pode ser apenas uma lenda, mas os chineses já conheciam o trigo cerca de 2 mil anos antes de Cristo e aprenderam a fazer, com a farinha, pão no vapor, macarrões, pastéis e uma grande variedade de massas que hoje fazem parte da culinária oriental mais apreciada.

O Bolo

Alguns historiadores acreditam que em 700 aC no Egito já se vendiam pães e biscoitos adocicados e existe um painel com registro de vários tipos de pães e bolos datado por volta de 1175 aC, ilustrando a confeitaria da corte do faraó Ramsés III.

Os romanos conheciam a técnica da fermentação, e por este motivo, 

desenvolveram várias receitas de bolos, inclusive com a adição de frutas secas e até mesmo queijo.

Na Roma antiga era tradição de servir bolos em casamentos, costume nas famílias mais abastadas que preparavam a massa com ingredientes especiais, tradicionalmente usados como oferenda aos deuses, como frutas secas, nozes e mel. 

Este doce não era para ser consumido, mas os convidados o amassavam por cima da cabeça da noiva, tal como se faz hoje com arroz na saída da igreja. Desejava-se que os deuses trouxessem prosperidade, sorte e fertilidade. 

Este costume foi levado por Júlio César para a Bretanha, em 54 aC, e passou a fazer parte dos hábitos das populações locais. 

Na Inglaterra, os bolos decorados apareceram pela primeira vez na corte de Elizabeth I, basicamente se usava pasta de amêndoas moldada em vários formatos. Os ingredientes ficavam cada vez mais sofisticados e exóticos, já que o Império britânico fornecia produtos de todo o mundo.

As primeiras receitas que se tem registro e a que mais se aproxima dos bolos de hoje é uma receita italiana, de bolo de amêndoas, servida em Nápoles, em 1478. 

A Itália e considerada como a precursora na arte de bolos decorados. Quando Catarina de Médici se casou com o rei na França, Henrique II levou como dote confeiteiros, e seu bolo de casamento foi o primeiro a ser confeccionado em andares. A técnica foi difundida pela França e em 1660, quando o rei Charles II retornou de seu exílio, para reclamar o trono inglês, levou consigo sequilhos feitos por habilidosos confeiteiros franceses. A partir daí os bolos ricamente decorados passaram a 

ser um hábito e também um símbolo de status e poder econômico.

No Brasil o primeiro bolo desembarcou na tarde de 24 de abril de 1500, dois dias depois da chegada do almirante Pedro Álvares Cabral ter desembarcado em Porto Seguro. Neste dia ele recebeu uma dupla tupiniquim para uma refeição a bordo da nau capitânia onde foi servido peixe cozido, pão e um doce: o fartem de Beira, ou fartes, como é chamado ainda hoje em Portugal. Esse bolo, com recheio de amêndoa ou creme e de elaboração requintada, passou para a história como o primeiro doce saboreado por "brasileiros". Conforme o folclorista Luís da Câmara Cascudo, na História da Alimentação no Brasil (Global Editora, São Paulo, 2004), o fato foi narrado por Pero Vaz de Caminha e os índios "gostaram pouco", pois não lhes agradavam ao paladar e jogava fora rapidamente tudo o que levavam à boca.

As receitas com açúcar começaram a desembarcar na Colônia desde a instalação das capitanias hereditárias, no entanto, com a vinda de família real e com a chegada da corte, em 1808, a culinária se europeizou definitivamente. E a tradição doceira se firmou estimulada pelas técnicas de preparo, enriquecida pela oferta de frutas tropicais e pelas adaptações de ingredientes que se fizeram necessárias. Porém, as fórmulas tradicionais não perderam a majestade. Ao contrário, atravessaram os tempos e muitas delas alcançaram os dias atuais, incorporando modificações mínimas. Entre os doces mais antigos que sobreviveram, encontram-se além do fartes, as queijadinhas de 

amêndoas, o pudim marfim, o manjar-branco, o pão-de-ló e o bolo podre.

Hoje podemos afirmar que embora os bolos sempre tenham estado associados a festas e comemorações, com o tempo, tornou-se um alimento mais comum, presente quase que diariamente à mesa. 

 

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